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sábado, 17 de dezembro de 2011

Remédios super super faturados

Um levantamento feito pelo Tribunal de Contas da União (TCU) mostra quão contraditório é o slogan da primeira promessa de campanha cumprida pela presidente Dilma Rousseff, o Saúde Não Tem Preço. Desde fevereiro, o programa oferece gratuitamente medicamentos para hipertensão e diabetes em estabelecimentos particulares com o selo “Aqui tem farmácia popular”. Até então, o governo já bancava 90% do valor dos remédios, enquanto os pacientes pagavam o restante. A partir de fevereiro, o subsídio cresceu para 100%. Os números, porém, desautorizam a mensagem da publicidade oficial. As compras de medicamentos feitas pelo governo não só têm preço, como são muito mais caras que aquelas realizadas por outros governos e pelo próprio Ministério da Saúde.

Um exemplo são as duas variedades de insulina disponíveis no programa. O Ministério da Saúde paga às farmácias credenciadas R$ 26,55 por unidade entregue ao paciente. O valor é quase o triplo do pago pelo mesmo produto pela Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo numa compra realizada em novembro, R$ 8,20.

A diferença não revela nenhum mérito extraordinário de gestão do governo paulista. No ano passado, o próprio Ministério da Saúde comprou a mesma insulina por R$ 3,80 a unidade, menos da metade do preço pago por São Paulo e apenas 14% do valor praticado no programa Saúde Não Tem Preço. De acordo com o TCU, casos semelhantes acontecem em todas as regiões do país.

Uma auditoria feita pelo Tribunal em 2010 comparou o que o governo federal paga por 14 medicamentos do programa Saúde Não Tem Preço com os valores pagos pelos mesmos produtos em 26 prefeituras do país. Resultado: 13 eram mais caros no programa federal. Quatro deles custavam mais de 1.000%.

Parte da explicação para as disparidades está na diferença entre os modelos de compra. Os medicamentos oferecidos em postos de saúde são comprados por licitação. Ganha quem oferece o menor preço. Essa compra centralizada, quase sempre em grandes quantidades e diretamente dos laboratórios, permite ao poder público obter descontos consideráveis. O programa Saúde Não Tem Preço prevê que o governo pague diretamente às farmácias por unidade de remédio vendida. Além de remunerar as últimas empresas da cadeia produtiva, a compra é fracionada, feita em baixa escala.

O que mais chamou a atenção do TCU não foi a existência de diferença de preços, mas o grau da disparidade de valores. Outro aspecto questionado pelo TCU é a falta de critério para avaliar se essas disparidades são razoáveis. “O ministério não apresenta estudos que justifiquem o custo-efetividade do programa”, escreveram os auditores do Tribunal.

Se tiver interesse mesmo em economizar, o governo tem agora mais um argumento. O número de beneficiários do programa subiu 264% entre janeiro e novembro. Passou de 853 mil para 3,1 milhões. Com isso, o aumento global dos gastos com o programa foi de R$ 250 milhões, em 2010, para R$ 655 milhões, em 2011. Tamanho crescimento surpreendeu o próprio governo, que foi obrigado a suplementar o orçamento do programa ao longo do ano e a suspender o credenciamento de novas farmácias.

Ninguém questiona a necessidade de facilitar o acesso da população a medicamentos contra doenças crônicas, atualmente as que mais matam no país. Uma pesquisa realizada pelo Ministério da Saúde mostra que 23% dos adultos do Brasil têm hipertensão e 6% sofrem de diabetes. Não há consenso, no entanto, sobre a melhor forma de distribuir o tratamento. O tema dividia as opiniões dentro do próprio governo já no início do primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, diz Gastão Wagner, secretário executivo do Ministério da Saúde entre 2003 e 2004. Wagner deixou o governo com críticas ao que ele chama de viés publicitário, em privilégio de programas como o Farmácia Popular. “Eu defendia que o Saúde da Família (de prevenção e atenção básica) tivesse prioridade, mas o argumento da área de marketing do governo é que esse programa não era novo. Então, não seria uma marca do governo”, diz.

O Ministério da Saúde afirma que, além de facilitar o acesso aos medicamentos, o programa Saúde Não Tem Preço absorve custos como a distribuição e o pagamento de funcionários. O ministério afirma ainda que monitora constantemente os preços cobrados no mercado privado para verificar se o ministério paga um valor adequado. Por fim, diz que encomendou à Universidade Federal do Rio Grande do Sul um estudo para responder se o governo federal paga caro demais pelo programa. O melhor teria sido se tivesse estudado antes de começar a pagar, não?

Fonte Revista época

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