Que o Ministro Marcelo Ribeiro devolveu o mandato ao Vereador Marco Prado, certamente isso todo mundo já sabe, mas o que ninguem deve saber são os motivos que levaram um Ministro de uma Corte Superior conceder liminar sobre ilícito em eleição.
Tive a curiosidade de ler a decisão prolatada pelo Ministro e observamos dois ítens de alta relevância que deveriam ter sido observadas pela Justiça Eleitoral , ainda em 1ª instância.
O primeiro ítem trata do artigo da Lei eleitoral em que Marco prado fora denunciado. Segundo o Ministro o artigo não deveria ser este , senão vejamos:
[...]Ocorre que a conduta que ensejou a cassação do diploma, tal como delimitada nos acórdãos recorridos, não se subsume ao tipo do art. 41-A da Lei nº 9.504/97, que descreve como captação ilícita de sufrágio a doação, o oferecimento, promessa ou entrega ao eleitor[...]
O segundo ítem trata de perda de prazo para a sentença, vejam:
[...]Cumpre ressaltar que, não obstante tenha sido o requerente condenado também por abuso do poder econômico, a cassação do registro seria inviável, por ter sido a decisão prolatada em 15.5.2009 (fl. 219), após a diplomação dos candidatos eleitos no pleito de 2008.[...]
E para finalizar, o Ministro canetou;
[...]Creio, portanto, ao menos neste juízo de cognição sumária, que está demonstrada a plausibilidade das razões recursais, no que tange à indicada violação ao art. 41-A da Lei nº 9.504/97.
Ante o exposto, defiro a liminar, para determinar o retorno do requerente ao cargo de vereador até o julgamento do recurso especial por esta Corte.[...]
Com o retorno de Marco Prado, por enquanto cai por terra os julgados da justiça Eleitoral de Sobral, que tentaram cassar o Mandato de 02 candidatos: Chico Jóia , que já havia sido absolvido pelo TRE-Ce e agora Marco Prado que consegue liminar no TSE. ( falta o julgamento de mérito).
Fica a pergunta?
Quem está errado ??
O MP eleitoral e o Juíz que confirmou a denúncia ou os tribunais Superiores que reformularam as decisões.?
Como existe um ditado que diz que decisão de Juiz não se discute, se cumpre, colocaremos na íntegra a decisão prolatada pelo Ministro Marcelo Ribeiro para que você tire suas próprias conclusões.
DECISÃO
Cuida-se de ação cautelar, com pedido de liminar, ajuizada por Marco Antônio Barroso Prado, eleito vereador no pleito de 2008 do Município de Sobral/CE, visando à atribuição de efeito suspensivo a recurso especial eleitoral interposto de acórdão do Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE/CE), que, mantendo sentença, cassou o diploma do requerente, por captação ilícita de sufrágio e abuso do poder econômico, em sede de ação de investigação judicial eleitoral (fls. 2-34).
Sustenta a presença do fumus boni juris, nos seguintes termos:
a) a determinação da decisão recorrida, de imediata interrupção do mandato de vereador, viola o direito do autor, que está amparado pela presunção de inocência e somente poderia perder o mandato eletivo depois de decisão final do Tribunal Superior Eleitoral;
b) somente poderia ocorrer o afastamento do autor se as acusações contra ele fossem baseadas em provas robustas e incontroversas, nos termos da jurisprudência do TSE;
c) "[...] ABSOLUTAMENTE NENHUM dos depoimentos transcritos, de forma parcial na decisão ora recorrida, revelam qualquer participação do recorrente nos fatos que foram objeto da apuração ou mesmo indicam, sequer por suposição, que houve a sua anuência com tais práticas" (fl. 13);
d) a Corte Regional, ao concluir pela prática de captação ilícita de sufrágio, consignando que ¿`à unanimidade das testemunhas deixam sem sombra de dúvidas a intenção de arregimentação de pessoas, que se fizeram presentes nas proximidades dos locais de votação, confessando que receberam material de campanha no dia da eleição, e, transitavam pelas ruas ostentando adesivos do Recorrente, além da promessa de remuneração¿" (fls. 13-14), violou o art. 41-A da Lei nº 9.504/97 e divergiu da jurisprudência deste Tribunal;
e) "impõe-se, segundo a lei, a jurisprudência e a doutrina eleitoral, que a oferta, entrega, promessa ou a doação de bem ou vantagem pessoal se destine a obtenção de voto (se dê mediante a promessa de sufrágio) e que a ordem tenha sido efetivada pelo próprio candidato, a seu mando ou que o mesmo tenha expressamente anuído com tal prática" (fls. 14-15), o que não ficou evidenciado no caso dos autos;
f) "[...] os depoimentos colhidos por ocasião do procedimento administrativo instaurado no âmbito do MPE, de forma isolada, sem a participação do recorrente, não se mostram hábeis a servir de prova válida à cassação de seu mandato [...]" (fl. 18);
g) a decisão impugnada considerou que haveria nos autos fotografias, mas "não indicou de que forma uma fotografia de pessoas reunidas pode relevar, por si só, qual foi a data em que foi obtida tal fotografia - se no dia da eleição ou não - bem assim, como se chegou à conclusão de que, olhando-se a foto, saiba-se qual a intenção das pessoas fotografadas" (fl. 20);
h) "não competia ao recorrente comprovar a inexistência dos fatos e nem a sua não participação nos mesmos, mas à acusação provar que os mesmos existiram e que o recorrente deles participou e que com os mesmos anuiu, o que, inegavelmente não ocorreu nestes autos" (fl. 23);
i) "[...] ao considerar a existência, no caso, de abuso de poder econômico, a decisão recorrida violou os artigos 128 e 460 do CPC, por ter ido além do pedido inserto na exordial, portanto, proferido julgamento de forma EXTRA PETITA, o que não é permitido pelo ordenamento jurídico vigente, ofendendo-se assim o PRINCÍPIO DA ADSTRIÇÃO DA SENTENÇA AO PEDIDO" (fl. 25);
j) não há no corpo do voto condutor do acórdão, assim como na peça vestibular, qualquer elemento que comprove a existência de abuso do poder econômico.Sustenta que, não obstante já estar afastado do cargo, o periculum in mora "poderá advir ao Promovente com a demora na prestação jurisdicional definitiva" (fl. 28), pois a execução da decisão atacada impede o autor de exercer o mandato de vereador para qual foi eleito, prejuízo que será irreparável.
Requer a concessão de medida liminar inaudita altera pars, a fim de conferir efeito suspensivo ao recurso especial interposto, nos autos do processo RE nº 15.215, com o imediato restabelecimento do mandato de vereador do autor.
É o relatório.
Decido.
Em juízo preliminar, entendo que se faz presente o fumus boni juris.Depreende-se dos autos que o Juiz Eleitoral da 24ª Zona Eleitoral, julgando procedente AIJE, cassou o diploma do requerente, com base nos arts. 30-A e 41-A da Lei nº 9.504/97, concluindo também pela ocorrência de abuso do poder econômico e do crime de boca de urna previsto no art. 39, § 5º, II, da Lei das Eleições, em razão da contratação de quarenta cabos eleitorais para trabalharem como fiscais no dia da eleição. O acórdão regional manteve a sentença, concluindo pela prática de captação ilícita de sufrágio. Destaco excertos do decisum (fls. 345-351):
Ao analisar as provas produzidas durante a instrução processual, o Juízo de piso reconheceu ao cometimento da infração ao art. 41-A, da Lei nº 9.504/97, imputada ao recorrente, restando por exarar a judiciosa decisão de fls. 139/148. [...]
A humildade das testemunhas empresta as suas declarações uma maior confiabilidade, valendo, registrar que os depoimentos prestados por ocasião do Procedimento Administrativo Eleitoral nº 03/2008 foram todos ratificados em Juízo, à exceção da Sra Luciene de Aquino do Nascimento.
Mesmo assim, a referida testemunha afirmou ter tido a impressão de que como havia trabalhado no dia da votação iria receber R$ 20,00 (vinte reais) - fls. 84 do PAE nº 03/2008, apenso.
Ora, o que se avalia é a conduta praticada no dia da eleição, o elemento volutivo (sic) na hora decisiva do pleito, sendo que a referida testemunha confessou ter agido em função da promessa do recebimento do dinheiro, posteriormente desmentida, mesmo assim, restou configurada a conduta da compra de voto, além de ter que ficar nos arredores dos locais de votação ostentando botons do candidato realizando a captação de sufrágio.[...]Nesse caso, o vínculo havido entre essas pessoas e o candidato, através do Sr. Lolô, se contratadas ou se voluntárias, é o que menos interessa ao deslinde, importante saber se a conduta delas, sob o comando e ordens do sr. Lolô, visou à captação de votos, circunstância que restou incontroversa.
Assim, à unanimidade das testemunhas deixam sem sombra de dúvidas a intenção da arregimentação de pessoas, que se fizeram presentes nas proximidades dos locais de votação, confessando que receberam material de campanha no dia da eleição, e, transitavam pelas ruas ostentando adesivos do Recorrente, além da promessa de remuneração.[...]Mais uma vez temos que o Sr. Lolô é o liame a apontar, na pior das hipóteses, o consentimento do Recorrente com a conduta ilícita perpetrada, vez que efetivamente houve a distribuição de material de campanha no dia da eleição, além de arregimentação de pessoas para servirem de `fiscais do candidato¿ e o fato dos mesmos serem conhecidos de longas datas.
Ao julgar os embargos de declaração, o Tribunal Regional manteve a condenação pela captação de sufrágio, consignando, ainda, a ocorrência de abuso do poder econômico, conforme se extrai do seguinte trecho do julgado (fl. 401):
Enfatizo que a alegativa do embargante de que a cassação do diploma, com respaldo nos fatos expendidos, ocasionaria à inobservância aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade não prospera, de vez que da leitura do acórdão ora embargado encontra-se expressamente e exaustivamente discutida a matéria, sendo feita por ocasião da sessão de julgamento, uma análise criteriosa da própria captação ilícita de sufrágio e abuso de poder econômico, condutas praticadas pelo embargante, que tiveram o condão de gerar o desequilíbrio da disputa eleitoral, comprometendo, efetivamente, a legitimidade e normalidade das eleições de 2008, no município de Sobral.
Ocorre que a conduta que ensejou a cassação do diploma, tal como delimitada nos acórdãos recorridos, não se subsume ao tipo do art. 41-A da Lei nº 9.504/97, que descreve como captação ilícita de sufrágio a doação, o oferecimento, promessa ou entrega ao eleitor, ( grifo nosso )com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição.
A Corte a quo concluiu que "a distribuição de material de campanha no dia da eleição, além de arregimentação de pessoas para servirem de `fiscais do candidato¿" (fl. 351), com o consentimento deste, caracterizaria o ilícito de compra de votos, o que, ao menos em princípio, não se coaduna com o texto da lei e com o entendimento jurisprudencial deste Tribunal sobre o tema, tal como ressaltado pelo requerente.
Ademais, a eventual prática do crime de boca de urna pelo candidato não dá ensejo à condenação pelo ilícito de captação de sufrágio, porquanto, nos termos da jurisprudência desta Corte, as condutas são distintas e estabelecem sanções diversas.Em resposta à Consulta nº 552/DF, rel. Min. Maurício Correa, DJ de 26.5.2000, esclareceu este Tribunal que a prática de boca de urna não configura violação ao art. 41-A da Lei nº 9.504/97. Transcrevo a ementa do julgado:
CONSULTA. "BOCA DE URNA" E "CAPTACÃO DE SUFRÁGIO". DISTINÇÃO.1) A "boca de urna" e caracterizada pela coação, que inibe a livre escolha do eleitor (Lei nº 9.504/97, artigo 39, § 5).
2) A "captação de sufrágio" constitui oferecimento ou promessa de vantagem ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto (Lei nº 9.504/97, artigo 41-A, acrescido pela Lei nº 9.840/99).Consulta respondida negativamente.
No mesmo sentido o Acórdão no 2.364/PB, de minha relatoria, DJe de 10.5.2010.
Cumpre ressaltar que, não obstante tenha sido o requerente condenado também por abuso do poder econômico, a cassação do registro seria inviável, por ter sido a decisão prolatada em 15.5.2009 (fl. 219), após a diplomação dos candidatos eleitos no pleito de 2008.( grifo nosso )
Creio, portanto, ao menos neste juízo de cognição sumária, que está demonstrada a plausibilidade das razões recursais, no que tange à indicada violação ao art. 41-A da Lei nº 9.504/97.
Ante o exposto, defiro a liminar, para determinar o retorno do requerente ao cargo de vereador até o julgamento do recurso especial por esta Corte.
Comunique-se, com urgência, ao egrégio Tribunal Regional Eleitoral do Ceará.Cite-se. Publique-se.
Brasília-DF, 21 de maio de 2010.
Ministro Marcelo Ribeiro, relator.